O actual panorama da televisão na cidade do Porto, quer ao nível da emissão televisiva propriamente dita, quer na denominada produção de conteúdos e programas, corresponde ao seu pior momento desde o aparecimento das televisões privadas na primeira metade dos anos 90. E reflecte, de modo peculiar, a crescente inexistência política da Região Norte.
Na segunda cidade do país, a SIC e a TVI dispõem somente de delegações sem produção própria, de pequenos escritórios com meia-dúzia de profissionais e escassa ou nenhuma autonomia, estruturas cada vez mais dispensáveis na "guerra" das audiências que se joga em Lisboa - e cada vez mais somente em Lisboa. Mesmo a TVI, que chegou a apostar no Porto para a emissão do seu jornal da hora de almoço, numa tentativa de contrariar o predomínio do Jornal da Tarde da RTP (historicamente produzido no Porto com sucesso consolidado ao longo de muitos anos), recuou rapidamente nos seus intentos descentralizadores.
Mas a SIC e a TVI são empresas privadas, embora relativamente condicionadas pelo contrato de concessão televisiva que lhes permite usufruir do espaço hertziano público, o que as desresponsabiliza da obrigação social e política de procederem de modo diferente. Já quanto à RTP é completamente diferente - ou deveria ser completamente diferente -, por causa das obrigações mais apertadas que decorrem do legalmente estabelecido serviço público de televisão. A verdade, porém, é que os responsáveis pela RTP, nomeadamente nestes últimos anos, mais não fizeram do que reproduzir no seu universo de actuação a lógica e a estrutura funcional do Estado a que pertencem, fruto de uma visão paternalista da província e de um modelo organizacional centralista.
Ao contrário do que foi amplamente apregoado, com muita falácia de conveniência, a administração cessante da RTP deixa o suposto centro de produção do Porto da RTP com menos horas de emissão e de produção própria do que tinha o mesmo Monte da Virgem quando começou o mandato de Almerindo Marques. Basta referir, na programação, a ida para Lisboa do "Portugal no Coração" (que ocupa as tardes da RTP1 de segunda a sexta-feira) e, na informação, a passagem da emissão vespertina da RTPN para a também lisboeta Marechal Gomes da Costa.
Em sentido contrário, pode argumentar-se que a administração cessante da RTP fez um investimento avultado no Monte da Virgem com a recente inauguração de novas instalações. Ou que demonstrou efectiva preocupação descentralizadora quando apostou na criação do denominado "Media Parque".
Nada mais falso o novo edifício serviu fundamentalmente para instalar a RDP, assim permitindo libertar as velhas instalações radiofónicas da portuense Rua de Cândido dos Reis; e o "Media Parque", por manifesto erro de concepção, típico de quem começa a construir a casa pelo telhado, revelou-se um fracasso absoluto, acabando por servir apenas para libertar alguns recursos humanos dos sectores técnicos da RTP.
Neste contexto, pelo simples facto de integrar quadros maioritariamente oriundos da cidade do Porto, a anunciada nova administração da televisão e rádio públicas parece trazer renovadas esperanças a quem acredita na necessidade política de uma RTP Porto forte e actuante no contexto nacional da emissão televisiva. Trata-se de uma necessidade que não é nem deve ser bairrista, mas sim pautada por uma visão multipolar de desenvolvimento.
Acontece, todavia, que o local de origem dos decisores nunca foi nem será nunca garante de coisa alguma. O que é preciso é que os novos responsáveis pela RTP percebam que o serviço público de televisão, para melhor cumprir os seus objectivos, carece de uma RTP Porto forte, de qualidade, com mais horas de emissão, que estimule a produção privada das produtoras externas (interagindo com elas e dessa interacção tirando proveitos próprios), que não desbarate os seus melhores recursos humanos, que não se sinta tentada a reproduzir localmente o pequeno poder dos medíocres, que possa contrariar, ou ajudar a contrariar, o progressivo esvaziamento do Porto (e do país que existe para além de Lisboa) no panorama mediático nacional.
Por manifesta falta de alternativas, essa missão compete à RTP Porto, que tem a vantagem indeclinável e acrescida de albergar a direcção de um canal tão importante, com tão elevada autonomia e com tanto potencial de crescimento como a RTPN. Mais do que tudo, é por este vector estratégico que passa o futuro imediato do Monte da Virgem. Se é que se pretende que o Monte da Virgem tenha futuro...
(Por Luís Costa no "Jornal de Notícias" em 29-12-2007)
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