Por Rui Moreira, no jornal "O Publíco" de 2-09-2007
A portofobia não é um mal recente. O meu avô materno, que nasceu alfacinha mas adorava a nossa cidade, dizia que quando descia à capital e ouvia algum "lisboeta" a zombar do Porto, sabia logo que estava na presença de alguém que nascera na província. Esse complexo de superioridade dos deslumbrados que tentavam ser "mais papistas do que o Papa" para serem aceites nos salões da sociedade lisboeta era desforrado no Porto com desdém ou com a correspondente lisbofobia.Hoje, a portofobia alastrou para além das fronteiras da capital. Agora, e para lá da conhecida aversão ao FC Porto, até a inofensiva Fundação de Serralves começa a inspirar grandes alergias. Já se conhecia a soberba e a inveja de alguns críticos de arte que preferiam ir a Santiago do que passar pelo Porto, mas faltava conhecer ainda a versão oficial desse sentimento. Esse momento solene ocorreu na inauguração do Museu Berardo, onde, inspirado certamente pelo seu assessor cultural (porque não posso acreditar que a ministra da Cultura já esteja convertida e "aculturada" às modas da capital), o primeiro-ministro exclamou, extasiado: "Antes, o roteiro da arte contemporânea acabava em Madrid. A partir de hoje, começa aqui".
A portofobia transformou-se, pois, num fenómeno de intolerância com cunho oficial, partilhado pela gente bem e culta de Lisboa que exercita o seu narcisismo pretensioso e parolo falando dos horrores do Porto, pelo frequentador anónimo dos fóruns radiofónicos que acha que todo o "mal vem lá de cima", pelo bloguista maledicente que acha que o Porto é uma tragédia e pelo taxista da Lourinhã que odeia as vitórias do FC Porto. Com esta democratização da repulsa, tornou-se também politicamente correcto correlacionar algumas das características que nos são atribuídas com os piores arquétipos. Alguns dos grandes escribas do regime, transformados em sacerdotes do opinião, já nem sequer fazem cerimónias e imputam-nos todas as culpas pelos nossos males e pelo estado da Nação: a crise da economia tem como origem a falta de visão dos industriais nortenhos que exploraram a mão-de-obra barata e até o trabalho infantil e os infames empresários têxteis que compraram Lamborghinis em vez de máquinas; a corrupção tem o seu maior expoente nos construtores civis nortenhos, nos caciques que controlam as autarquias "lá do Norte" e nos clubes de futebol, de que o FC Porto é o expoente máximo porque nunca teria ganho campeonatos se não recorresse a todas as batotas.
Com todas as televisões concentradas em Lisboa, o Porto acaba por só ser notícia pelas piores razões e, se porventura algum de nós reclama, aparece logo o mais eficientes dos antídotos: alguém que finge simpatizar com o Norte ou que se confessa adepto de um dos nossos clubes, para explicar com ar contristado que os nortenhos são uma espécie de gauleses, gente simpática mas que nunca se entende. Os efeitos dessas ladainhas vão-se entranhando e, de certa forma, o povo do Norte, de que os tripeiros são o espécime mais conhecido, substituiu os alentejanos como vítimas favoritas do anedotário nacional. Claro que ninguém que gosta do humor de qualidade, neste país de tristes, se esquece do saudoso Estebes, mas a moda de ridicularizar o nosso sotaque já invadiu a publicidade, onde não aparece um burgesso que não fale à moda do Porto. Será que é normal que uma marca de automóveis os resolva promover através de graçolas de mau gosto em que se achincalha a nossa maneira de falar? Em Espanha, não se atreveriam a ridicularizar um dos dialectos ou idiomas regionais, com medo das represálias do mercado. Os nuestros hermanos não são para brincadeiras e quando o Governo da Catalunha recomendou aos seus cidadãos que evitassem o aeroporto de Madrid nas suas ligações aéreas, os madrilenos ripostaram boicotando a cava catalã. Talvez seja altura de começarmos a ser bairristas no consumo, penalizando as empresas que nos desconsideram, que deslocalizam competências para Lisboa. Talvez seja esse o último instrumento de pressão que nos resta.
2 comentários:
Nunca vi tanta parvoice escrita num único texto..
Acho que quem escreveu este texto devia fazer uma visita a Lisboa...ao Júlio de Matos.
o que é interessante nestes sítios, é o tipo de gente que por aqui anda. Este comentário superior merecia que tão douta personagem saisse do anonimato para percebermos o tipo de merda que flutua por aquelas bandas sulistas...
Mas isso é esperar sentado, que estes cobardolas são assim. Sempre na horizontal!
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