...infelizmente bastantes deles oriundos da minha região e alguns deles da minha cidade, esses sim, os que me causam mais revolta e desprezo...
O lisbonário
O lisbonário não é lisboeta. Não se confundam os dois géneros. O lisboeta, o verdadeiro alfacinha, nasceu lá e é filho de várias gerações também lá nascidas. Vive em Alfama, no Castelo, em Campo de Ourique ou em Campolide. Os de extracção mais recente nos Olivais ou em Chelas. O lisbonário não. O lisbonário nasceu lá para as beiras, Trás-os-Montes… alguns até no Porto.
O alfacinha, tirando obviamente as chamadas classes “altas”, que, mau grado, existem em todo o lado, é povo – mesmo povão. O lisbonário não. O lisbonário é filho da pequena nobreza e pequena burguesia rurais. É filho do médico das pequenas cidades de província, do mestre-escola, ilegítimo de padre com mais amor a rabo de saia do que ao evangelho, do farmacêutico, do lavrador mais ao menos abastado, do pequeno funcionário público, do chefe da estação (no tempo em que os havia), do comerciante relativamente bem sucedido, e por aí abaixo…
O lisbonário estudou. Foi à universidade. Tirou curso. Em direito ou finanças principalmente. Senhores engenheiros também. O seu primeiro objectivo é trabalhar para o estado. Arranjar emprego público. Seguro. Sem chatices. Para começar não é mau. Os de direito sonham em chegar a juízes, procuradores, agentes da PJ. É bom andar de comboio, sem pagar, em 1ª classe, e poder passear a nossa arrogância sobre os passageiros e funcionários. O trabalho também não mata. De Coimbra a Lisboa é um tirinho e 4ª feira à tarde já estamos de regresso.
Mais tarde ou mais cedo, o lisbonário muda-se para Lisboa. Arranjou colocação num ministério. Foi promovido. Ou então subiu na hierarquia e já manda. Manda no país. Suprema condição. Eu, o Zé da loja, mando no país todo.
O lisbonário nunca perde afinal a sua condição de provinciano. Mesmo em Lisboa, e a mandar, nunca saiu afinal da sua aldeia mental. O lisbonário acha que só ele é que sabe. O lisbonário não confia em ninguém. O lisbonário julga que todos os que não chegaram a Lisboa – onde ele chegou! – não são competentes. O lisbonário, em Lisboa, tem um terror irracional aos que fora de Lisboa possam ser melhores que ele. O lisbonário quer controlar tudo. O lisbonário gosta de humilhar. O lisbonário quando falha é exímio em sacudir a água do capote atirando as culpas para fora de Lisboa, onde ele está. A culpa é sempre da “província”. Quanto mais para norte mais "província". O lisbonário só confia nele e nos seus apaniguados igualmente lisbonários. Os lisbonários são maioritariamente adeptos do Benfica, porque sim e porque fica sempre bem. Alguns são procuradores. Gerais e generais. Outros são políticos. Até engenheiros com projectos assinados. Todos eles são nada.
(Por António Alves no blogue "http://norteamos.blogspot.com/" em 3-03-2008)
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