domingo, 27 de janeiro de 2008

Uma equipa só joga o que a outra a deixa jogar

«O Porto?! Esqueça o Porto! O Porto não vai a lado nenhum. Quer ser igual a Lisboa. As pessoas do Porto não se entendem umas com as outras e só sabem estar sempre a lamentar-se. Esqueça o Porto!».

Esta frase reproduz aproximadamente a resposta dada por Augusto Mateus ao meu amigo Daniel Deusdado, quando ele introduziu na conversa o tema Porto.

Para os mais distraídos, informo que o Daniel é um militante da causa nortenha e o inventor daqueles que são provavelmente os mais inovadores e frescos produtos portugueses de Media que viram a luz do dia neste século– o Inimigo Público e a Liga dos Últimos.

O encontro com Augusto Mateus foi obviamente em Lisboa, local de peregrinação semanal do Daniel. A isso é obrigado por via dos negócios que mantém com as Produções Fictícias e da necessidade de arranjar trabalho e contratos para a sua produtora de televisão (Farol de Ideias).

Para os mais distraídos, informo que Augusto Mateus, ex-ministro da Economia de Guterres, é um dos mais proeminentes e influentes membros da inteligência socialista – e tem lugar garantido na lista das 500 mais capazes cabeças do nosso país.

«Esqueça o Porto!», o conselho de amigo dado por Mateus ao Daniel, já foi seguido por milhares de quadros nortenhos que ou fizeram as malas e emigraram para a capital – ou então enchem os Alfas na madrugada e manhã de 2ª feira e tardes de 6ª.

Esquecer o Porto foi o que já fez o Governo Sócrates - e não é preciso usar óculos para ver o trágico resultado deste esquecimento.

Quase metade dos 450 mil desempregados oficiais do IEFP (os números que retratam a triste realidade são bem mais cruéis) são no Norte.

Dos 150 mil desempregados sem qualquer espécie de rede social (ou seja deixaram de estar habilitados a receber qualquer tipo de subsídio) a esmagadora maioria (90 mil) são do Norte.

O Vale do Sousa é a zona do país onde se regista a mais elevada taxa de desemprego (11%).

O Norte é a segunda região quando se trata de contribuir para o PIB mas a última no momento da distribuição da riqueza (quem tiver dúvidas faça a fineza de consultar as estatísticas do INE sobre a distribuição regional do PIB).

Os números mostram outra verdade de sangue. Nada está a ser feito para inverter esta tendência. O Porto recebe apenas 1/3 das verbas transferidas do Orçamento de Estado em 2005. As verbas do Pidacc para o distrito caírem em mil milhões de euros. Um bilião a menos!

Se a crise que dilacera o coração do Norte tivesse o epicentro em Lisboa, já teria sido estabelecido o pandemónio. Ninguém conseguiria atravessar o Tejo nos cacilheiros da Transtejo. Os trabalhadores do Metro e da Carris estariam em greve por tempo indeterminado. Os funcionários públicos ficariam em casa. As bandeiras negras seriam hasteadas. E o Governo, aterrorizado, já se teria precipitado em apagar o fogo com dinheiro, comprando Auto-Europas e faraónicas obras públicas que decapitassem a crise.

Numa coisa Augusto Mateus tem razão. Uma parte da culpa por este estado de coisas é nossa. Uma equipa só joga aquilo que a outra a deixa jogar. Não podemos gastar o tempo em lamúrias, como velhas nas salas de espera de um Centro de Saúde, e esperar sentados que o Terreiro do Paço abdique voluntariamente do poder absoluto que concentrou - e se convença que o resto do país não é só paisagem.

Os vistosos sucessos do FC Porto e da Sonae provam que se soubermos ser competentes e profissionais conseguiremos triunfar, apesar de termos de ser duas vezes mais capazes e trabalhadores para superar o vento contra e as armadilhas que nos espalham no caminho.

O problema é que o individualismo inscrito no código genético nortenho é uma característica positiva quando se trata de esgravatar saídas para a crise e de furar vidas (e é o pai da rede de PME que caracteriza o tecido empresarial nortenho) mas é negativo quando se trata de unir forças.

Estamos calhados para nos desenrascarmos. Ao cada um por si. Mas o facto de não estarmos habituados a voar em formação é pernicioso para a causa do Norte.

Para triunfarmos – e isso significa regionalização e um Governo do Norte, com poder e já! – temos de falar a uma só voz. Nenhum exército ganha uma batalha se cada um dos soldados estiver indisciplinadamente entretido a lutar por si e para seu lado.

Segunda e terça feira, a Universidade do Porto promove no Palácio da Bolsa um conclave em que participarão uma centena de personalidades nortenhas, entre as quais se contam Daniel Bessa, Rui Moreira, Sobrinho Simões e Artur Santos Silva.

Seria bom que este conclave fosse o primeiro passo no sentido da criação de um movimento que combata pelo progresso da região. Não faltam generais. O que faz falta é um estado maior coeso e um exército disciplinado.

Usando a imagem do meu amigo Manuel Serrão, o Batalhão Bússola, do Exército da Salvação Nacional, está às ordens – e já abriu as hostilidades.


(Por Jorge Fiel no blogue "http://bussola.blogs.sapo.pt/" em 25-01-2008)

Sem comentários: